Wellcome

segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Se Eu Quiser Falar Com Deus


Quando Kurt Cobain morreu, foi para o céu (todos os roqueiros vão para o céu). Chegando lá ele encontrou os outros que haviam partido antes dele: lá estavam Elvis, Jonh Lennon, Jimmy Hendrix, Janis Joplin, Freddie Mercury e num canto, se olhando atentamente em um espelho, o Bono Vox. Aí o Kurt Cobain disse: “espera aí! O Bono ainda não morreu!” então o Jonh Lennon chegou no ouvido dele e disse: “aquele ali nâo é Bono Vox. Aquele é Deus. Ele só pensa que é o Bono Vox.” ........... RÁ, RÁ, RÁ, RÁ!
Piadas infames à parte, o que teriam a dizer os protagonistas de um ritmo tão maldito como o rock and roll sobre o todo poderoso? O próprio Jonh Lennon da piada escreveu uma canção intitulada “God”, cuja letra era uma espécie de credo apostólico às avessas e na qual Jonh relacionava uma série de coisas nas quais ele não acreditava (em Cristo, no Papa e etc.) ao que Bono Vox respondeu com outra canção intitulada “God part II” em que rebatia as “descrenças” de Mr. Lennon.

Mas Deus é “brasileiro”, e sendo assim os roqueiros brazucas são quem tem mais autonomia para falar sobre o tema. Os mesmos já se referiram a Deus de forma contestadora como Cazuza na música “cobaias de Deus”, ou Lobão na música “pobre Deus”; de forma debochada como o Camisa de Vênus: “Deus me dê grana”; de forma anárquica como os Titãs em “homem primata”: “eu aprendi/a vida é um jogo/cada um por si/ e Deus contra todos”. Raul Seixas, místico como era, sempre se referia à Deus ou ao demo em suas letras e Renato Russo, como não poderia deixar de ser, escreveu um verso ao mesmo tempo genial e contraditório na música “depois do começo”: “Deus...Deus/somos todos ateus” , ora, se você se dirige diretamente à Deus não pode ser ateu e se você é ateu não pode se dirigir à Deus de forma direta, mas tudo bem...gênio é gênio.

O Kid Abelha fez uma canção na década de 80 na qual pedia: “Deus, apareça na televisão” E NÃO É QUE ELE APARECEU!!! Calma que eu explico: é que nos anos 70, um inglês anônimo ao ouvir Eric Clapton não teve dúvidas e saiu pichando nos muros do reino unido: “ERIC CLAPTON É DEUS” e como você já sabe o homem, aliás, Deus teve sua imagem super exposta na MTV na década de 90, por conta do clip de “tears in Heaven”.

Bem... no mais, como eu disse no começo, dentro da piada, todos os roqueiros vão pro céu, pois todos eles são loucos (uns mais, outros menos) e está escrito que os loucos não errarão o caminho. E nós que os ouvimos, somos poucos,Mas também somos muito loucos. E no final, ainda tem os Mutantes na célebre “balada do louco”, na qual o maluco mais-que-beleza Arnaldo Baptista diz: “eu juro que é melhor/não ser um normal/se eu posso pensar que Deus... sou eu”. E quem vai dizer que ele não é?

Que Deus te abençoe.

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

...E o Vento Levou


“A resposta, meu amigo, está soprando no vento.”

Bob Dylan em “blowin in the wind”


A canção cujo trecho foi citado na introdução, é considerada a mãe de todas as canções de protesto. Sua letra é toda construída com perguntas tipo: “por quantas estradas um homem tem que andar, antes que possa ser chamado homem?” ; “por quantas vezes as balas de canhão devem voar, até que sejam banidas para sempre?”; “quantos ouvidos o homem deve Ter para que consiga ouvir as pessoas chorando?” e “quantas mortes serão necessárias para que o homem saiba que já se matou demais?”. E a resposta , Mr. Dylan deixou a cargo da consciência de cada um. Aliás, a banda Los Hermanos em seu último álbum, nos deu uma belíssima canção com o título “o vento”, e nela também existe uma expectativa de resposta eólica: “o vento vai dizer lento que virá....”. mas que reposta o vento nos trará?

A banda alemã Scorpions, fez muito sucesso com a música "winds of change" (vento de mudanças) por ocasião da Perestróika, a abertura política iniciada por Mikhail Gorbachev nos anos noventa. "atentem para os ventos de mudanças" dizia a canção, mas, o que ele dizia na verdade? que mudanças ele traria?

Na canção “eternas ondas” de Zé Ramalho, e que foi eternizada por Fagner, tem um lindo verso que diz: “se esse seu amigo vento não lhe procurar/ é porque multidões ele foi arrastar.” E enquanto o nosso amigo vento arrasta multidões, também inspira canções como “vento no litoral” da Legião Urbana, na qual Renato Russo canta: “de tarde quero descansar/ chegar até a praia e ver/ se o vento ainda está forte/ e vai ser bom subir nas pedras/ sei que faço isso pra esquecer/ eu deixo a onda me acertar/ e o vento vai levando tudo embora...” . É uma canção bem melancólica, bem dor-de-cotovelo, mas muito bonita, como quase todas da Legião. Mas, e a resposta?


Uma das mais belas canções sobre o vento, é de um grupo que sempre foi execrado pela crítica especializada, o Biquíni Cavadão. A canção “vento ventania” tem versos lindos como: “quero juntar-me a você/ e carregar os balões pro mar/ quero enrolar as pipas nos fios...” e “quero mover as pás dos moinhos/ e abrandar o calor do sol/ quero emaranhar os cabelos da menina/ mandar meus beijos pelo ar...” só pra citar alguns, já que a letra toda é uma bela poesia. Mas... e a resposta?

Bem, eu acho que a resposta já nos foi dada, e por uma banda que também foi muito criticada, e cuja única canção de sucesso é justamente essa, a da resposta. O nome da banda é Kansas, e a resposta foi uma paulada no nosso orgulho através da canção “dust in the wind”: “poeira no vento... tudo o que somos é poeira no vento” . Doeu, não?

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

Splish Splash!


“Você tem exatamente/três mil horas pra parar de me beijar”
Cazuza em “por que que a gente é assim”

Beijar é muito bom! Não é à toa que o Cazuza queria ficar três mil horas beijando, o que sem dúvida seria o recorde mundial e entraria para o Guiness Book. E foi ele mesmo quem cantou em “todo amor que houver nessa vida: “Eu quero a sorte de um amor tranqüilo,/com sabor de fruta mordida,/nós na batida, no embalo da rede,/matando a sede na saliva...” e haja saliva! E a sede nunca é saciada, pois quanto mais se beija, mais vontade se tem de beijar. Mas, Cazuza também tinha os seus momentos de solidão e lábios secos, como cantou nos versos da canção “o tempo não pára”: “... cansado de correr na direção contrária/sem pódios de chegada ou beijos de namorada,/ eu sou mais um cara...”.
“Aquele beijo que eu te dei/ nunca, nunca mais esquecerei...” cantou o rei Roberto Carlos, mas não se sabe se esse tal beijo inesquecível foi o mesmo da canção “splish splash”, na qual ele “rouba” um beijo dentro de um cinema. Aliás, dentro de cinemas não são comuns esses beijos “onomatopéicos”, sendo preferidos os beijos mais silenciosos e “calientes”. Mas na canção do rei, o mesmo “splish splash” reflete o tapa que ele levou após o beijo roubado, o que talvez tenha também contribuído para que o beijo fosse inesquecível.
Mas, o beijo é retratado de outras formas em várias canções: Rita Lee cantou o beijo sombrio em “doce vampiro”:
“venha me beijar,/ meu doce vampiro,/na luz do luar...” beijo de vampiro remete a um beijo selvagem, misturado com mordida, o que nos faz voltar a canção do Cazuza lá da introdução que tem um verso que diz assim: “canibais de nós mesmos/ antes que a terra nos coma...” fazendo imaginar os amantes devorando a língua um do outro. Alceu Valença cantou o beijo tropical em “morena tropicana”: “... beijo travoso de umbu, cajá./ pele macia, ai carne de caju/ saliva doce, doce mel, mel de uruçu...”. Elvis Presley pediu: “kiss me quick”, “beije-me rápido, enquanto ainda temos esse sentimento.”, enquanto o Red Hot Chilli Peppers cantou o beijo lascivo em “suck my kiss”(chupe meu beijo). E na música “kiss” o baixinho Prince cantou: “você não precisa ser rica pra ser minha garota/ você não precisa ser boa pra governar meu mundo//... eu quero apenas seu tempo extra e seu... beijo”.

No Brasil teve até uma banda de Axé chamada Banda Beijo, e lá nos “States” tem o famoso grupo de rock mascarado, o KISS, sendo que para alguns religiosos, esse “KISS” não tem nada de “beijo”, mas seria uma sigla para Knights In Satan Service, ou “cavaleiros à serviço de satanás”.
E pra finalizar, uma canção do Barão Vermelho, da fase pós Cazuza, que retrata o beijo depois que a paixão acaba. A música se chama “beijos de arame farpado” e, pelo menos o título foi copiado de uma canção da banda inglesa Jesus and Mary Chain (barbed wire kisses). Mas a letra é muito legal, e diz assim:
“naqueles dias, todo dia eu renascia
na pele dos teus lábios.
E trazia comigo uma oração,
Porque naqueles dias
Eu te amava demais.
Eram dias de pura luz
Refletida nos metais,
E pelos nossos beijos,
Caravelas de línguas passeavam
Em delírios fluviais.
Amor à luz de velas,
Mensagens na garrafa perdida,
Vindas na saliva de outros carnavais.
Mas hoje em dia, meu amor,
Nossos beijos têm sabor enferrujado,
E nos machucam a boca
Feito arame farpado...”

domingo, 7 de outubro de 2007

Isso é que é!


“faltava abandonar a velha escola,/tomar o mundo feito Coca-Cola...”
Lulu Santos em “o último romântico”



Houve uma época em que a briga da Coca-Cola era com a Pepsi. “Briga” no bom sentido. Na busca pela preferência do consumidor, na disputa pela maior fatia do mercado, na luta para vencer a concorrência na base da propaganda e do marketing. Daí apareceram os chamados “mendigões”, aqueles refrigerantes mais baratos que ficaram com uma boa fatia de consumidores com menor poder aquisitivo. Houve até um “barraco” entre a Coca-Cola e uma dessas novas marcas de refrigerantes, a Dolly. Acusações de um lado e de outro, e eu me lembro até que a Dolly espalhou alguns outdoors pela cidade com os dizeres: “confirmado. A Coca-Cola utiliza folhas de coca.”.
Ora, se eu bem me lembro, nas tampinhas das embalagens mais antigas da Coca, vinha escrito na descrição dos ingredientes: “refrigerante à base de extrato de coca e noz de cola”, o que depois foi mudado para: “extratos vegetais e cafeína”. Ou seja, o pessoal da Dolly “descobriu a América”.
Mas, com ou sem extrato de coca, o fato é que a Coca (Cola) vicia. Não é à toa que ela é uma das marcas mais famosas do mundo, um dos produtos mais consumidos do planeta. Salvador Dalí e Andy Wahrol retrataram a famosa garrafinha em sua arte. E ela já apareceu também na letra de várias canções, afinal, a Coca (cola) é pop. Além da de Lulu Santos que foi citada na introdução,
podemos citar “alegria alegria” do Caetano: “eu tomo uma Coca-Cola,/ ela pensa em casamento/ e uma canção me consola...”; Jackie Tequilla, do Skank: “Jackie Tequilla, Coca-Cola e água/ égua, língua, míngua minha mágoa.”. Na música “chocolate” o Tim Maia canta: “não quero Coca-Cola, eu só quero chocolate...”, mas aí o páreo é duro, pois o chocolate também vicia e é outra grande paixão mundial. É difícil entender o sentido da letra de “come together” dos Beatles, mas lá tem um personagem que atira em garrafas de Coca-Cola.
As canções de protesto também mencionaram o famoso líquido escuro. Quem não se lembra de “geração Coca-cola” da Legião Urbana? E de “revoluções por minuto” do RPM que dizia: “agora a china bebe Coca-Cola/ e aqui na esquina cheiram cola...”? Na canção “movido a álcool”, Raul Seixas faz um protesto bem humorado contra a transformação do álcool em combustível, o que segundo ele, diminuiria o estoque de “cana” nos botecos. E em uma parte da letra ele diz: “veja o poeta inspirado em Coca-Cola,/que poesia mais estranha ele iria expressar!”. Na poesia eu não sei, mas nas letras de canções pop ela encaixou-se muito bem. E ainda tem a música “terra de gigantes”, dos Engenheiros do Havaí, que tem aquele famoso verso: “a juventude é uma banda/ numa propaganda de refrigerante”. E quem ousaria dizer que esse “refrigerante” que o Humberto Gessinger citou na letra não é Coca-Cola?



P.S. Não recebi um centavo da Coca-Cola pelo merchandising...

segunda-feira, 1 de outubro de 2007

A Dança da Chuva


"que a chuva caia como uma luva,/um dilúvio, um delírio/
Que a chuva traga/alívio imediato"
Engenheiros do Havaí, em "alívio imediato"




Há alguns anos atrás, quando o tempo estava claro e firme, com dias de sol e noites estreladas, dizia-se que o tempo estava bom; quando o tempo estava nublado e com chuvas, o tempo estava ruim. Aí veio um período de estiagem prolongada, e começou a faltar água em muitas regiões, e para piorar ainda mais a situação, o nível dos reservatórios que abastecem as usinas hidrelétricas ficou muito baixo, fazendo-se necessário o racionamento de energia em vários estados. Desde então, os dias claros e de sol são "tempo bom", e os dias cinzentos e chuvosos... São tempo bom também. Daí faz sentido os versos dos Engenheiros, citados na introdução; e faz sentido também quando o Guilherme Arantes canta: "deixa chover/ ôôô deixa a chuva molhar...", ou quando o Jorge Benjor canta: "chove chuva/ chove sem parar...". E esse mesmo Benjor também cantou assim: "lá fora está chovendo/mais assim mesmo eu vou correndo/só pra ver o meu amor..." pois a chuva também inspira canções de amor... Ou de solidão, como a canção "me chama", do Lobão: "chove lá fora e aqui/faz tanto frio/me dá vontade de saber/onde está você/me telefona/me chama/me chama/ me chama...". É comum dizer que na ausência da pessoa amada, o sol não brilha. Por isso, nas canções de "dor de cotovelo", a chuva é muito associada às lágrimas. Na canção "crying in the rain" (chorando na chuva), gravada pelo grupo A-Ha, o personagem diz que vai ficar chorando na chuva, pois ele tem o seu orgulho, e não quer que a pessoa amada perceba que ele está chorando. E estando ele na chuva, sua amada não conseguirá distinguir o que é lágrima e o que é chuva. Esse artifício, aliás, já foi usado pelo Roberto Carlos na música "sentado à beira do caminho" : "...minhas lágrimas e os pingos desta chuva/se confundem no meu pranto",
E também na música "chuva fina no meu pára-brisa" : "...visibilidade distorcida/pela lágrima caída/pela dor da solidão". Sem falar na canção "lágrimas e chuva" do Kid Abelha, que não é propriamente uma canção de "dor de cotovelo" , mas molha tudo.
A verdade é que chuva é sinônimo de fartura. Até no mundo do rock. A região de Seattle, nos Estados Unidos, é famosa pela proliferação de bandas como Nirvana, Alice in Chains, Pearl Jam, Soundgarden, Ted, Mudhoney, Green River, Mother Love Bone, Temple of the Dog e etc.. E a explicação para essa fartura de bandas veio de um integrante do Mudhoney: "é que por aqui chove o tempo todo, então a galera fica sem Ter o que fazer e monta uma banda de rock e fica ensaiando na garagem".
Enfim, se chuva é sinônimo de fartura e de boas colheitas, a imagem que devemos guardar dela é a imagem de Gene Kelly com seu guarda-chuva dançando e cantando "singing in the rain" feliz da vida no filme "cantando na chuva". Se no período de seca, os índios norte-americanos fazem a dança da chuva pedindo para que os deuses reguem a terra, a dança de Gene Kelly, ao contrário, parece uma celebração, um agradecimento aos céus pelo bálsamo que ajuda a sustentar a vida no planeta Terra. Deixa chover que é bom!
Hit Parade "chuvoso":
"a voz da chuva" Barão Vermelho
"it's raining again" Supertramp
"rain" Madonna
"purple rain" Prince
"chorando no campo" Lobão
"have you ever seen the rain" e "who'll stop the rain" Credence Clearwater Revival
"temporal de amor" Leandro e Leonardo (Arrghhh!)

domingo, 23 de setembro de 2007

Como é que se diz?


“... mas se um dia eu/puder te encontrar,/eu quero contar/o quanto eu sofri/por todo esse tempo que eu quis lhe falar...”

Roberto Carlos



Eu tentei dizer, mas não saiu nada. Não é nada fácil. E olha que são só três palavrinhas! Um pronome pessoal do caso reto, um pronome pessoal do caso oblíquo e um verbo no presente do indicativo... Mas como é difícil pronunciá-las! Pode ser até fácil dize-las ao telefone, no final de uma ligação, ou durante um abraço, quando os olhos estão voltados em direções opostas, mas dizer olhando diretamente nos olhos da outra pessoa é difícil.
O filme “Cinema Paradiso”, do diretor Giuseppe Tornatore, conta a história da paixão do garoto Salvatore, o Totó, pelo cinema. E também sua amizade por Genaro, o velho operador do cinematógrafo. Totó não assistia aos filmes da platéia. Ele via os filmes na sala do projetor junto com seu amigo. E ali aprendeu muito sobre cinema e sobre a vida. Na pequena cidade do interior da Itália onde o cinema ficava localizado, havia um padre que, antes do filme estrear para o público, assistia à fita sozinha com uma sineta na mão. Se houvesse alguma cena de beijo, ou alguma mulher com os ombros ou parte das costas despidos, o religioso balançava a sineta e o velho Genaro, o operador, marcava no rolo o local que ele teria que cortar. Eram tempos ainda conservadores, e assim, o público do lugar ficou um bom tempo sem assistir uma cena mais romântica.
Um dia houve um incêndio no cinema, e o velho Genaro foi salvo justamente pelo garoto Totó, mas o velho ficou cego, e o equipamento de projeção ficou inutilizado. Um empresário local bancou um equipamento mais moderno, e que não permitiria cortes nas fitas, mas o velho Genaro estava cego e não poderia operá-lo. Só que, de tanto assistir aos filmes ali da sala de projeção, o garoto Totó havia aprendido todo o funcionamento da máquina e passou a ser o novo operador. No dia em que o primeiro filme foi exibido sem cortes, na primeira cena de beijo a platéia veio a baixo em aplausos, e quando foi mostrada uma atriz com um decote mais ousado, um garoto na platéia exclamou em voz alta: “noooossa! Como ela é gostosa!”.
Por ocasião da morte de Genaro, Totó, já adulto e agora vivendo em Roma, retorna à cidade para os funerais do velho amigo que lhe ensinou muito sobre o cinema, a vida e o amor. Ao chegar lá, descobre que o velho havia lhe deixado uma caixa com um rolo de filme. Ele então fica curioso para saber o conteúdo da fita, e procura uma sala de projeção mais próxima, já que o velho Cinema Paradiso havia fechado. E quando o filme começa a rodar, qual não foi sua surpresa: lá estavam todas as cenas de beijos que o velho Genaro havia cortado de todos os filmes censurados pelo padre, e que habilmente o velho Genaro havia montado como um filme só. Era uma seqüência fantástica de beijos antológicos das grandes estrelas dos primórdios do cinema.
Agora, o que tudo isso tem a ver com as três palavras sobre as quais eu falava no início do texto? É que, imitando o velho Genaro, eu me propus a fazer uma colagem de trechos de músicas que contenham as famosas três palavras, e os que eu encontrei, além da do Roberto que eu coloquei na introdução, foram estas:
“... vem me fazer feliz, pois.................../você deságua em mim, e eu oceano,/esqueço que amar é quase uma dor.”
Djavan, em “oceano”


“......................,como se chama tua cor?/cada dia abrindo o véu de nossa dor...”
Beto Guedes em “lágrimas de amor”


“como quem vai ao cinema...................../como quem sai da cadeia,/
Como quem planta um roçado..................como quem volta da feira...”
Alceu Valença em “................................”


“eu nunca te disse/ não tem onde caiba/.......................sim..................../serei pra sempre o teu cantor.”
Caetano Veloso em “..................”


“... e hoje em dia,/como é que se diz...................”
Legião Urbana em “vamos fazer um filme”


“............................calado/como quem houve uma sinfonia/de silêncio e de luz”
Lulu Santos em “certa coisas”

É... Não deu. Realmente, tem certas coisas que eu não sei dizer...

sábado, 15 de setembro de 2007

As Mil e Uma Noites


“... E pra piorar, quem te governa não presta.”
Barão Vermelho em “declare guerra”


Na década de oitenta, os Paralamas do Sucesso lançaram uma música chamada “Luiz Inácio e os 300 picaretas”. A letra de Herbert Viana fazia alusão a uma declaração de Lula, então deputado federal, de que o congresso nacional era formado por “trezentos picaretas com anel de doutor”. É impressionante como, cerca de quinze anos depois, a letra da canção continue tão atual, vide os últimos episódios de corrupção no governo, culminando na absolvição do senador Renan Calheiros na semana que passou.
Um dos primeiros versos da canção diz assim: “eles ficaram ofendidos com a afirmação/ que reflete na verdade o sentimento da nação”. E o sentimento da nação, expresso em e-mails dirigidos ao senado, e aos jornais de todo o país logo após a vergonhosa absolvição, foi de vergonha e indignação. Só que, como cantou o Skank, “a nossa indignação é uma mosca sem asas./não ultrapassa a janela de nossas casas”. E a canção dos Paralamas continua com o seguinte verso: “É lobby, é conchavo, é propina, é jetom./variações do mesmo tema sem sair do tom...”. Incrível, não é? Parece que a música foi escrita esses dias, pois nunca se viu tantos lobbys, conchavos e propinas rolando nos três poderes que regem a nossa pátria. E a letra continua: “Brasília é uma ilha, eu falo porque eu sei./uma cidade que fabrica suas próprias leis”. Todas as leis em benefício de vossas excelências, diga-se de passagem.
“Parabéns coronéis! Vocês venceram outra vez./o congresso continua a serviço de vocês...”. Eis aí outro verso da mesma canção que parece ter sido feito ontem. O povo já está cansado de ver aquele bando de larápios engravatados usando o congresso e o senado em benefício próprio. Enquanto isso, fora da “ilha”, é apagão pra tudo quanto é lado: na saúde, na educação, na segurança, apagão aéreo e apagão de ética e decência em Brasília. O verso seguinte é assim: “Papai, quando crescer eu quero ser “anão”,/pra roubar, renunciar e voltar na próxima eleição...”. O verso, irônico, refere-se ao episódio dos chamados “anões do orçamento”, no qual a corja que sempre anda por aquelas bandas surrupiou o dinheiro da viúva (como sempre). Talvez, se o Herbert escrevesse a letra hoje, ele substituiria “anão” por “mensaleiro” ou “sanguessuga”, mas a essência seria a mesma.
Na seqüência, vêm os seguintes versos: “Se eu fosse dizer nomes, a canção era pequena:/João Alves, Genebaldo, Humberto Lucena...”. Se o Herbert fosse citar todos os nomes hoje, a letra da canção seria mais longa do que a de “faroeste caboclo” da Legião. Haja espaço para nomes como o do próprio Renan, Joaquim Roriz, Roberto Jefferson, José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, Antônio Palocci e etc. E o que mais dói, é saber que, assim como os “anões do orçamento”, nenhum deles vai pra cadeia. Afinal, como diz o último verso da música: “Ladrão que rouba ladrão, e ainda recebe concessão/ de rádio FM e Televisão.”
A situação só é diferente por um detalhe: o mesmo Lula que disse a frase que inspirou a canção, naquela época era “pedra”, e agora virou “vidraça”. E, em seu silêncio presidencial diante disso tudo acaba tornando-se parte do todo, uma espécie de “Ali-Babá e os trezentos ladrões”( tai um bom título para uma nova canção sobre o mesmo tema), afinal, quem cala consente...

sábado, 8 de setembro de 2007

O Nome, A Cor e a Flor


“queixo-me às rosas./ que bobagem, as rosas não falam,/simplesmente as rosas exalam/ o perfume que roubam de ti.”
Cartola, em “as rosas não falam”




Rosa no nome, rosa na cor, rosa na flor... o “pink” do Pink Floyd não se referia à cor. O nome Pink Floyd era uma homenagem aos dois bluesmans favoritos de Syd Barret: Pink Anderson e Floyd Council. Rosa no nome também tem o Samuel do Skank, uma das grandes bandas da geração 90. Da geração 80/90 tem também o Gun’s n’ Roses, mas, muito antes deles o mundo sempre foi dividido entre armas e rosas. E teve até uma arma que virou rosa... não, não me refiro à flor e sim à “rosa de Hiroshima, a rosa hereditária/a rosa radioativa, estúpida, inválida/a rosa com cirrose a grande rosa cálida” como cantaram os Secos e Molhados; e contra essa rosa, a geração “flower power” despejou canções floridas, com pacifistas como Jonh Lennon e Bob Dylan.
A pantera do rock and roll nunca foi cor-de-rosa. A banda Pantera, liderada pelo mal encarado Phil Anselmo, mandou letras negras como “cowboys from hell” e “cemetery gates”, mas o som do rock foi surrealisticamente rosa, pelo menos em um dos últimos discos de estúdio do Pato Fu, que foi batizado de “ruído rosa”.
Rita Lee cantou: “por isso não provoque./é cor de rosa choque...” na letra de uma das mais célebres canções em homenagem a mulher. Mas tem gente que acha que a cor “rosa” representa apenas estereótipos de mulher. A patricinha, a boazinha, a frágil, a sensível, destoando assim da imagem da mulher “machona”, da guerreira, da lutadora que as feministas pregam. Mas a mulher tem mesmo esses dois lados, como bem cantou a Rita em outra parte da canção exaltando o “sexo frágil” que não foge à luta.
O nome da..., a cor de..., e pra não dizer que não falei de flores, foi a Ana Carolina quem disse (na canção intitulada “rosas”) que toda mulher gosta de rosas. E vale lembrar o cenário florido no qual o Nirvana gravou seu “acústico MTV”: Todas aquelas rosas e aquela iluminação fúnebre parecia um velório antecipado de Kurt Cobain. E o clip da música “perfeição” da Legião Urbana, com Renato Russo deitado na relva e as pétalas de rosa caindo sobre ele, fazendo lembrar um poema em que Fernando Pessoa pedia: “...coroai-me de rosas”. E em matéria de rock Brasil, Renato é o rei. Coroai-o ... de rosas.

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Armas e Rosas


“A minha alma está armada/e apontada para a cara do sossego...”
O Rappa em “ minha alma”






Há alguns anos atrás, foi realizado um referendo sobre a proibição ou não da venda de armas de fogo no país. A maioria da população votou pelo “não”, achando que a proibição desarmaria apenas a população de bem, deixando-a ainda mais indefesa diante da bandidagem, e que isso não resolveria o problema da violência. Isso foi há uns dois ou três anos mais ou menos (na época eu votei pela proibição), e de lá pra cá pouca coisa mudou e a violência continua.
Quando Pablo trouxe a famosa “Winchester 22” para seu primo João de Santo Cristo, com certeza não sabia o fim trágico do final da canção, já que a arma derrubou de uma vez o triângulo amoroso: “...e Santo Cristo com a winchester 22/deu cinco tiros no bandido traidor/Maria Lúcia se arrependeu depois/e morreu junto com João, seu protetor...”. Mas esta estória ilustra bem de onde vem a maioria das armas em circulação no país: Pablo era um traficante peruano que vivia na Bolívia, e a arma foi contrabandeada como acontece na maioria das vezes na vida real. Isso quando não são os próprios policiais que apreendem armas e depois as vendem para os meliantes. Pelo jeito que falam por aí, até parece que tem uma loja de armas em cada esquina, ( eu pelo menos nunca vi uma em toda a minha vida) e que proibindo o comércio de armas de fogo vão acabar com o problema da violência.
Tudo bem, se diminuir um pouco já é alguma coisa, e quanto menos armas estiverem em circulação, menos teremos chances de que algumas delas caiam nas mãos dos “Mark Chapmans” da vida, e assim, vidas de muitos “Jonh Lennons” sejam poupadas, pois o “pop” não poupa ninguém e até o Papa levou um tiro à queima roupa. E o próprio Marcelo Yuka, autor dos versos que eu citei no início, se tornou uma vítima dessas malditas.
Elton Jonh pediu: “don’t shoot me I’m only a piano player” (não atire em mim, sou apenas um pianista) e Bob Marley atirou no xerife (“I shot the sheriff”), mas confessou que não atirou para matar (“but I did not shot to death”) e o Aerosmith cantou a saga de uma pistoleira chamada Jane (“Janes got a gun”) mas existem outros tipos de armas além das de fogo: palavras são armas (tem até uma banda de Hip Hop chamada Calibre Verbal) e até a música é uma “arma” . Roberta Flack até cantou naquela balada brega: “killing me softly with this song” e o U2 tem uma belíssima canção do álbum “The Joshua Tree” chamada “one tree hill” que tem os seguintes versos: “no nosso mundo, um coração de trevas,/uma zona de fogo/onde os poetas deixam seu coração falar,/e então sangram.../Jara cantou, e sua canção era uma arma/nas mãos do amor./você sabe que seu sangue continua gritando do chão.”. E não poderiam faltar os Beatles que têm uma canção chamada “happiness is a warm gun” (a felicidade é uma arma quente) da fase psicodélica da banda, em que as letras eram em sua maioria feitas sob o efeito de LSD, por isso, quando Jonh Lennon canta: “when I hold you in my arms/and I feel my fingers on your trigger” não se sabe bem se ele está se referindo a uma arma ou a uma pessoa.
...e a continuação da canção do Rappa diz: “pois paz sem voz não é paz, é medo”. Poderíamos então encarar esse referendo que aconteceu como “a voz da paz”? Talvez sim, porém é um grito ainda muito sufocado pela violência reinante. Devemos amplificar nosso grito, até que o som de “give peace a chance” seja mais audível do que o daquele instrumento que sempre dá a mesma nota: “Ra-tá-tá-tá!”.



PS. Mas se depois de ler o texto você ainda quiser me atirar, mate-me logo, à tarde, às três, à noite eu tenho um compromisso e não posso faltar, por causa de você... (essa é do Belchior)

sábado, 25 de agosto de 2007

Automóveis (atropelamento e fuga)



“Vital andava à pé e achava que assim estava mal”, daí apareceram os Beatles e disseram: “baby, you can drive my car” . Thank you, mas não gosto de mão inglesa. Parece que a gente está sempre na contramão e pra parar na contramão já basta o Roberto Carlos. além do mais, o volante fica do lado direito e você fica o tempo todo procurando a alavanca de marchas do lado da porta. Prefiro buzinar meu calhambeque BIP!BIP!, aliás, “meu carro é vermelho e não uso espelho pra me pentear”; ele “não tem breque, não tem luz, não tem buzina/tem três carburadores, todos três envenenados/só para na subida quando falta gasolina/só passa se tiver sinal fechado”. O Capital inicial cantou: “Tenho pedras nos sapatos/onde os carros estão estacionados” e “as ruas tem cheiro de gasolina e óleo diesel” . “mas Vital comprou a moto e passou a se sentir total” ao que o Renato Russo respondeu: “motocicletas querendo atenção às três da manhã é só música urbana” . Tá certo que a polícia não entende e aí ele é obrigado a dizer: “qualé seu guarda/que papo careta/só tô tirando chinfra/com a minha lambreta.”
A Rita Lee pedia: “papai me empresta o carro/pra eu poder tirar um sarro com meu bem”... não sei se o pai dela era legal, mas o do Roger Moreira do Ultraje a Rigor era, pois foi ele que cantou: “e o meu carro foi meu pai quem me deu/filho homem tem que Ter um carro seu”.
pois é, a imagem do rock and roll sempre foi ligada à carangos e motocas, desde os Thunderbirds e lambretas dos anos 60 até chegar na impagável aventura dos Raimundos à bordo do Opalão na música “eu quero é ver o oco” e por falar em Opala, um Opala azul foi co-protagonista da canção suicida “dezesseis” da Legião Urbana, aquela em que Jonny bate de propósito com um caminhão por causa de um coração partido. E por falar em canção suicida, a música “there’s a light that never goes out” do The Smiths talvez seja a canção suicida mais bonita de todos os tempos. Nela, Morrissey canta os seguintes versos:
“...dirigindo no seu carro,
eu não quero mais voltar pra casa
porque eu não tenho mais casa.
e se um ônibus de dois andares
bater de frente com a gente,
morrer ao seu lado
seria morrer de um jeito celestial.
e se um caminhão de dez toneladas
matar a nós dois,
morrer ao seu lado,
o prazer e o privilégio seriam meus.”
E aí? Quer pegar uma carona com o Morrissey ou você prefere ir de táxi com a Angélica? Ou quem sabe no fuscão preto?
Os Mamonas Assassinas pelo menos tinham uma Brasília amarela e quando a Monica foi se encontrar com o Eduardo, ela foi de moto e o Eduardo de “camelo”. O Chorão do Charles Brown Jr. Também cantou: “ela tem carro importado e telefone celular/eu só tenho uma “magrela” e um AP no BNH”. Mas, quanto a mim nem isso. Eu tô mais pra aquela canção da Legião:
“andar à pé na chuva
ás vezes eu me amarro
não tenho gasolina
também não tenho carro
também não tenho nada
interessante pra fazer...
tédio com um T bem grande pra você!”




Vruuuummmmmmmmmm! Fui.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

O Reino de Morfeu


"O sono é bom.
Pois que acordamos dele
Para saber que é bom.
Se a morte for um sono,
Acordaremos dela.
Se não, não é sono."
Fernando Pessoa
O Sono
Na música "enter sandman" (entra o mestre dos sonhos), um rock pesado, com letra falando sobre pesadelos, monstros dentro do armário, debaixo da cama e etc., a banda Metállica encaixou aquela famosa oração que os pais ensinam as crianças recitarem antes de dormir: "agora me deito para dormir/ peço ao senhor pra minha alma guardar/ se eu morrer antes de acordar/ peço ao senhor pra minha alma levar". Esse sim, foi o verdadeiro "rock and roll lullaby", e não aquela baba que o B.J. Thomas cantava com esse mesmo título, e que foi sucesso na década de 70. "lullaby", é como se chamam as canções de ninar em inglês, e a banda The Cure também fez uma bela canção com esse nome.
Com canção de ninar ou não, todos concordam que tirar aquela soneca é realmente muito bom. Aquela famosa "sesta" depois do almoço, quando bate aquela "lombeira" então nem se fala! Mas o bom mesmo é dormir sem aquele chato do despertador por perto. Sem essa de acordar cedo! O negócio é fazer como o Renato Russo na canção "o mundo anda tão complicado" a qual tem um verso que diz: "hoje eu acordo ao meio dia/ amanhã é a sua vez". Renato Russo, aliás, parece que gostava de velar o sono da pessoa amada, pois nessa mesma canção, logo no início ele diz: "gosto de ver você dormir/ que nem criança com a boca aberta", e em outra canção chamada “antes das seis” ele canta assim: "daqui vejo seu descanso/ perto do seu travesseiro/ depois quero ver se acerto/ dos dois quem acorda primeiro". A Paula Toller também tinha essa mania, pois ela canta "ver você dormir/ me corta o coração" no início da impagável canção "deixa eu ser seu espião". Mas, a música na verdade era sobre ciúme, e a personagem doentia, tinha ciúmes até dos sonhos da pessoa amada.
Na canção MLK, do U2, Bono Vox canta assim: "durma... durma esta noite/ e que seus sonhos se realizem...". Ali, ele estava falando do sono eterno, o sono da morte, pois a canção era uma homenagem a Martin Luther King,
que morreu no ano de 1968, no meio de sua luta pelos direitos civis, em que ficou marcado seu famoso discurso "I have a dream" (eu tenho um sonho). Mas, como disse o poema do Fernando Pessoa que foi citado na introdução do texto, se a morte for um sono, acordaremos dela. Enquanto isso nada melhor do que tirar uma soneca daquelas. Só não pode é dormir no ponto como fez o baterista Pete Best, que faltou aos ensaios dos Beatles e acabou perdendo o posto para o Ringo Star, deixando assim, de fazer parte da maior banda de Rock de todos os tempos... é Pete Best, durma-se com um barulho desses! Aliás, Lennon e McCarteney escreveram um belo hino ao sono, a canção "I'm only sleeping", que tem versos como: "por favor não me acorde/não me balance/deixe-me onde estou/eu só estou dormindo..." e "parece que todo mundo me acha preguiçoso/eu não ligo, eles são loucos..." e no final, "por favor, não me estrague o dia/eu estou a milhas distante/e, afinal de contas/eu estou apenas dormindo." Lennon já dormiu o sono eterno, e se a morte for apenas um sono, ele vai acordar. McCarteney continua vivo, e é dono de uma das maiores fortunas da Inglaterra. Segundo o livro de provérbios, na Bíblia Sagrada, "doce é o sono do trabalhador, quer ele coma pouco ou muito; mas a fartura do rico não o deixa dormir". Paul, a essas alturas, não está conseguindo dormir em paz...

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Aquarela Sombria



Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo...
Amarelo pálido, desbotado, de uma estrela moribunda que esfria;
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo em ruínas,
Desmoronando, e habitado por ratos e lagartos;
Com um lápis em torno da mão eu me dou uma luva de boxe,
Para lutar contra meus monstros e medos;
E se faço chover, chove uma chuva ácida, de uma atmosfera impregnada de agentes químicos,
E com dois riscos tenho um guarda-chuvas perfurado, dilacerado pelos ácidos corrosivos.
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel,
Num instante imagino um abutre esfomeado
Voando sobre os cadáveres que apodrecem na terra deserta e devastada...
Vai voando, contornando as colunas de fumaça negra das florestas carbonizadas que fumegam,
E eu vou voando com esse abutre... viajando: Somália, Haiti, Etiópia, Serra Leoa...
Pinto um barco à vela que vai navegando mares poluídos até ser atingido por um beijo de um torpedo militar.
E entre as nuvens vem surgindo uma esquadrilha de caças, bombardeando a aldeia miserável,
E o bombardeio, à noite, parece uma queima de fogos de artifício mortal.
Basta imaginar, e a esquadrilha está sendo dizimada pela bateria antiaérea, e aquele soldado que ejetou antes do impacto não vai mais voltar...

Numa folha qualquer eu desenho um navio indo a pique, atingido por um submarino nuclear...
Não sobrou nenhum amigo, e eu bebo na taça amarga da solidão.
De uma América a outra o ódio e a intolerância se espalham em um segundo.
Giro um simples compasso, e num círculo eu faço um mundo apocalíptico.
Um menino caminha, e caminhando chega no paredão, de olhos vendados, diante do pelotão de fuzilamento.
E ali logo em frente, a esperar pela gente, está o futuro sombrio...
E o futuro é um poço escuro e sem fundo. não tem tempo nem piedade, mas tem licença pra matar...
Pode ser doença, atentado, bala perdida, e só nos resta chorar.
Nesta estrada esburacada, cheia de crateras de bombas, com os olhos ardendo, não dá pra enxergar o que virá.
Vamos todos juntos, como condenados, caminhando para o matadouro, numa passarela de horror, de uma aquarela que um dia enfim... chegará ao fim.

sábado, 4 de agosto de 2007

O Cineasta e a Morte





Quando ela chegou, o velho cineasta já estava a sua espera. Ela veio sombria como só ela sabe ser, e ele a reconheceu logo, afinal, ele já havia retratado-a em “O Sétimo selo”. E já sabia de suas intenções, já que na vida real ela nunca vem só pra conversar. Mesmo assim ele a convidou para uma partida de xadrez.
- Xadrez não, porque demora muito e eu tenho muito trabalho a fazer, mas aceito uma partida de damas – respondeu ela.
- Até que eu não a retratei mal - disse o cineasta - Se naquela época houvesse os recursos digitais que existem hoje eu teria feito melhor. Eu poderia colocar o mesmo vazio no lugar dos seus olhos, e deixar o seu sorriso assim mais cadavérico. Eu tive que carregar na maquiagem do ator, e, às vezes o resultado era mais cômico do que trágico.
- Você se saiu bem - respondeu ela – o resultado final foi impressionante. Efeitos especiais apenas divertem os olhos. O importante é que o filme tem alma, e você sabe que de alma eu entendo...
- Como está o velho Alfred lá do outro lado?
- Você está se referindo à Hitchcock?
- Ele mesmo...
- Ele adaptou-se bem. Ele sempre lidou bem com temas mórbidos aqui, então já estava meio que preparado.
- E quanto a Fellini?
- Esse não achou a morte tão “dolce” assim... aliás, devo lhe dizer que mais tarde venho buscar outro colega seu, que por sinal, também é italiano.
- Será o Roberto Benigni?
- Não. Ele ainda tem algum tempo para desfrutar da vida, a qual ele disse ser bela. Veremos o que ele vai achar de mim...
- Quem será então?
- Não apresse as coisas. daqui a pouco vocês vão se encontrar de qualquer forma...
Na tentativa de ganhar algum tempo, Bergman, o velho cineasta, esforçou-se bastante no jogo de damas e conseguiu um empate. Assim, a conversa rolou um pouco mais. Mas veio o desempate e a Morte venceu (na vida real, ao contrário do filme, ela sempre vence no final). Então, ela levantou-se e se pôs do lado direito do cineasta e ofereceu-lhe o braço. Os dois então, caminharam lentamente até a barca vil e sinistra que os esperava.
No mesmo dia,um pouco mais tarde, em Roma, a mesma barca estacionou em frente a casa de Antonioni. Só ele viu, mais ninguém, quando aquela figura de capa preta, olhar vazio e foice na mão, caminhou em sua direção e parou em sua frente. Ele levantou-se foi ao encontro dela e disse:
- você não me é estranha...


FIM

terça-feira, 31 de julho de 2007

Nonsense


" o que não é, é o que não pode ser que não é./
o que não pode ser que não,/ é o que não pode ser./
o que não pode ser que não é,/ é o que não é, o quê..."
Titãs, em "o quê"

O sentido

O que os Titãs queriam dizer com os versos citados aí em cima? Obviamente nada. A letra era só uma brincadeira, bem ao estilo de muitas outras da banda como "AA UU" , "cabeça dinossauro" e etc.. Algumas pessoas acham que as letras de música devem passar alguma mensagem, seja ela política, religiosa, ecológica ou de amor, e algumas letras até passam isso. Outras letras são tão simplórias que parecem estar lá só pra encher lingüiça enquanto a música rola. Outras pessoas acham que a música é só pra divertir, e não importa o que ela diga desde que se possa dançar ao som da mesma. Mas existem algumas letras de música que são difíceis de entender, e nós ficamos pensando no que será que certos compositores queriam dizer.
O jornalista Artur Xexéo, do jornal "O Globo", obviamente em tom de gozação, certa vez criou o troféu "zum de besouro", para premiar aquelas letras de música que dizem, dizem, e não dizem nada. O nome do troféu é uma referência à letra de "açaí", do Djavan, que diz assim: "açaí, guardiã,/ zum de besouro, um ímâ/ branca é a tez da manhã".
O Djavan, realmente, é mestre em fazer letras estranhas como essa. Outro exemplo é a letra de "flor de liz", na qual ele canta: "o meu jardim da vida/ ressecou, morreu/ do pé que brotou Maria/nem margarida nasceu". Outro autor de letras pra lá de esquisitas é o Carlinhos Brown. Na letra de "Maria de verdade", de sua autoria, tem os seguintes versos: "farinhar bem, derramar a canção/revirar o trem/ locomover a paixão" farinhar?! Estranho, não?. A letra de "uma brasileira", gravada pelos Paralamas, também é dele, e tem um trecho assim: "tati bitati, trate-me trate/ como um candeeiro bom/somos do interior/do milho..." fala sério Carlinhos Brown!
Mas há que se perdoar os dois, pois eles são discípulos de Gilberto Gil, que uma vez declarou que compunha as músicas pela sonoridade das palavras, e não pelo significado(ah! Então tá explicado!). o que dizer de versos como "água mole, pedra dura/tanto bate que não restará nem
pensamento" e "mães zelosas, pais corujas/vejam como as águas de repente ficam sujas" ambos da canção "tempo rei"? ou o que dizer da letra inteira de "refazenda"? "abacateiro, acataremos teu ato/nós também somos do mato/ como o pato e o leão..." e por aí vai. O fato é que não adianta querer procurar sentido em letras como "qualquer coisa" de Caetano Veloso: "sem essa aranha, sem essa aranha, sem essa aranha/ nem assanha arranha o cabo/nem o sarro arranha Espanha..."; ou naquela letra do Claudinho e Buchecha que diz "controlo um calendário sem utilizar as mãos" e até o Renato Russo em "se fiquei esperando o meu amor passar" na qual ele canta "sei rimar romã com travesseiro". Mas, a coisa não acontece só no Brasil. Um bom exemplo é a letra de "smell like teen spirit" do Nirvana. Afinal de contas, o que é que o Kurt Cobain quis dizer com aquele "um mulato, um albino/ um mosquito, minha libido"? troféu "zum de besouro pra ele!

segunda-feira, 23 de julho de 2007

Medo de Avião


“foi por medo de avião/que eu segurei pela primeira vez na sua mão”
Belchior em “medo de avião”


Aprendendo a voar
Deus não dá asa à cobra, e também não deu asas a o homem. O que não o impede de desejar voar, desejo esse antigo, como retrata a mitologia grega na estória de Dédalo e Ícaro. E se não conseguiu voar por si próprio, o homem partiu em busca de mecanismos que o alçasse em vôos. Leonardo da Vinci, em sua porção inventor, criou alguns desses mecanismos na tentativa de fazer o homem voar. Mas, o mérito ficou mesmo com Santos Dumont e/ou os irmãos Wright, que foram os primeiros a alcançar vôos, digamos assim, mais duradouros. Mas a invenção deles acabou resultando em vôos comerciais, no transporte coletivo de pessoas, e também em máquinas de guerra, e não no sonho romântico do vôo individual. Esse tipo de vôo ficou por conta de asas-deltas, ultraleves e pára-pentes.
O mundo da música é cheio de referências a aviões e vôos, como o trecho romântico da canção de Belchior que eu citei na introdução. Tem também o famoso “samba do avião”, de Tom Jobim. Nessa música, a fonte de inspiração foi quanto numa chegada ao rio por via aérea, ele contemplou de cima toda a beleza da cidade maravilhosa. As bandas Pink Floyd e Foo Fighters têm músicas homônimas: “learning to fly” (aprendendo a voar), e o Red Hot Chilli Peppers declararam que “music is my aeroplane”, exaltando a capacidade que a música tem de nos fazer voar nas asas da imaginação. Isso sem falar nas bandas que têm nome de avião, como a brasileira 14 Bis, egressa do famoso “Clube da Esquina” nas Minas Gerais, e que fazia uma mistura de rock progressivo com MPB; O B 52’s é outra banda com nome de avião, esse, um modelo militar muito usado pelos EUA desde a década de 50. Sem falar no U2, que teve o seu nome inspirado em um avião americano que invadiu o espaço aéreo russo em plena guerra fria, causando um incidente diplomático que ameaçou o futuro do planeta. E não podemos esquecer-nos do Barão Vermelho, nome inspirado em um piloto alemão de nome Manfred Von Richthofen, que morreu em combate na primeira guerra mundial, e que tinha esse apelido; Barão Vermelho também é um personagem do desenho animado “Corrida Maluca” que pilota uma “máquina” vermelha parecida com um avião de guerra antigo.
Mas, o lado triste de voar são as quedas, e os desastres aéreos. Isso nos faz lembrar o desastre que vitimou a banda Mamonas Assassinas que estava no auge do sucesso com o seu primeiro álbum lançado; e também no acidente aéreo que matou os cantores Ritchie Valens, autor da famosa canção “La bamba”, e o roqueiro Buddy Holly no dia 3 de fevereiro de 1959, que ficou conhecido como “o dia em que a música morreu”. Fazer o quê, né? Os riscos fazem parte da perigosa arte do vôo. E já foi dito que mais valem as dores das cicatrizes provocadas pela queda, do que a tristeza de nunca ter podido voar. E como disse Machado de Assis: “é melhor cair das nuvens do que do terceiro andar”.
E para aqueles que, como eu, têm medo de altura, a solução é voar só na imaginação, como na canção de Lupicínio Rodrigues: “... o pensamento parece uma coisa à toa/mas como é que a gente voa/quando começa a pensar!”. Ou como na canção “infinita highway” dos Engenheiros do Havaí, ficar “com a cabeça nas nuvens e os pés no chão”. Vale citar um trecho de “learning to fly” do Pink Floyd, que eu citei aí em cima: “não há sensação para comparar com essa/animação suspensa, um estado de benção/não posso tirar minha mente do céu circundante/língua presa e enrolada/só um desajustado e preso a terra, eu.”
Agora, caso você não tenha medo, é só fazer como na canção “o sonho de Ícaro”, de Guilherme Arantes e... “voar, voar... subir, subir...”

domingo, 15 de julho de 2007

O Mal do Século


"solidão, de manhã,/poeira tomando assento,/rajada de vento,/som de assombração..."
Djavan
Solidão

Solidão não é propriamente aquilo que sentia o personagem de Tom Hanks no filme "Náufrago". Ou não é só aquilo. O que vimos ali foi a "solidão física", a ausência de um único ser igual por perto, e por um longo período, para quem sempre foi acostumado a viver rodeado de pessoas de todos os tipos, fez com que o personagem entrasse em parafuso, a ponto de "cultivar amizade" por uma bola de basquete e até dialogar com ela. Ali ele não sentia falta só das pessoas amadas. Ele sentia falta do ser humano de um modo geral, até de seus defeitos. Mas existe o que eu chamo de "solidão social", que é aquele sentimento em que você se sente numa ilha, mesmo estando rodeado de pessoas. Tem também a "solidão ideológica", quando você está rodeado de pessoas que não compartilham dos mesmos pensamentos e idéias que você. Na verdade o título da crônica deveria se chamar "solidões", tantos são os seus tipos.
A maioria das canções que tratam do tema refere-se à solidão amorosa. São as famosas canções de "dor de cotovelo", falando de pessoas que foram abandonadas por seus pares, ou que estão a procura de um. Como exemplo, podemos citar a canção de Dominguinhos: "que falta eu sinto de um bem!/ que falta me faz um xodó!/ mas como eu não tenho ninguém,/ eu levo a vida assim tão só...", ou a canção do Peninha, "sozinho" que foi regravada por Tim Maia, Sandra de Sá e Caetano: "por que você me deixa tão solto?/por que você não cola em mim?/tô me sentindo muito sozinho...". E tem aquelas canções que, mesmo sem citar a palavra "solidão" deixam transparecer o desespero de quem está só, como a canção "me chama" do Lobão: "chove lá fora e aqui/ faz tanto frio!/ me dá vontade de saber/ aonde está você./me telefona./me chama, me chama, me chama...".
Mas o fato de se Ter um parceiro não é garantia contra a solidão, pois existe a "solidão à dois" como cantou o Cazuza na letra de "eu queria Ter uma bomba". Às vezes duas pessoas estão juntas fisicamente, mas suas mentes estão distantes um do outro, vagando em profunda solidão. Na canção "esperando por mim" do disco "A tempestade", Renato Russo se refere à solidão como o "mal do século", e depois dá a seguinte definição para ela: "cada um de nós imersos em sua própria arrogância/ esperando por um pouco de afeição". Essa seria então a "solidão egoísta", de alguém que só quer receber e não dar carinho e atenção.
"me sinto só./mas quem é que nunca se sentiu assim?" pergunta o CPM 22 no início da canção "um minuto para o fim do mundo". Mas será que é verdade? Existem aqueles que são solitários por natureza, mas será que aquela pessoa que é extremamente social, e que só vive em turmas também têm seus momentos de solidão? Nietzsche já nos falava sobre a importância do que ele chamou de "solidão de ermitão", que são aqueles momentos em que nós devemos passar sozinhos refletindo sobre a vida, analisando valores e conceitos, fazendo uma auto-avaliação e traçando metas e objetivos. A solidão de ermitão é solidão de montanha, é a solidão da contemplação, de quem se coloca em um plano superior para poder analisar os fatos e as circunstâncias que nos rodeiam. Poderíamos chamar essa de “a boa solidão”, ou “a solidão proveitosa”. Só é preciso tomar cuidado pra não se acostumar, e de repente, começar a conversar com objetos inanimados e chamá-los de "Wilson".

domingo, 8 de julho de 2007


"Um dia frio,/um bom lugar pra ler um livro,/
e o pensamento lá em você,/eu, sem você não vivo."
Djavan


Livro

O hoje mundialmente famoso escritor Paulo Coelho, começou como parceiro de Raul Seixas em diversas canções como "Gita", "eu nasci Há dez mil anos atras" dentre outras, e nelas já se percebia sua veia mística; desfeita a parceria, o mago partiu para a carreira de escritor e desde "o diário de um mago" vem emplacando sucessos editoriais, e recentemente foi até admitido na Academia Brasileira de Letras. Esse é um exemplo de que o mundo da música e o da literatura são muito próximos. O mundo da música já inspirou muitos livros e vice-versa. A lendária banda americana The Doors teve seu nome inspirado em um livro chamado "as portas da percepção", do escritor Aldo Huxley; Maria Betânia já lançou um disco com versos musicados de Fernando Pessoa; e o poeta Vinicius de Morais era letrista, parceiro de Tom Jobim, Toquinho e outros, jogando por terra a tese de algumas pessoas de que "letra de música é letra de música. Poesia é poesia.".
Raul Seixas era um auto-didata. Estudou filosofia e latim por conta própria, e embora tenha citado o personagem de Miguel de Cervantes na música "as minas do rei Salomão" ("veja quantos livros na estante:/Dom Quixote, o cavaleiro andante,/luta a vida inteira contra o rei"), escreveu assim na letra de "eu também vou reclamar" : "olho os livros na minha estante,/ nada dizem de importante./ servem só pra quem não sabe ler", mas é óbvio que era só mais uma letra debochada de Raulzito. Enfim, a música e a literatura são tão próximos que Caetano Veloso lançou um disco intitulado "livro", e como simultaneamente estava lançando um livro, pensou em batizar este de "disco", o que seria uma coisa bem "Caetanesca" ,mas isso acabou não acontecendo. Chico Buarque foi outro músico a enveredar-se pela literatura, com livros como "Estorvo" e "Budapeste", e tal como o músico, o escritor foi também muito elogiado pela crítica. O guitarrista Tony Belotto, dos Titãs, também escreveu um livro, que até virou filme: "Bellini e a esfinge", cujo personagem era um detetive que se amarrava em blues. E tal como nos livros, algumas músicas tem personagens e estórias com princípio, meio e fim, como "Eduardo e Mônica" e "faroeste caboclo" de Renato Russo, "construção" de Chico Buarque e "cidadão" de Zé Geraldo.
Mas, não poderia faltar a Bíblia, o maior dos best-sellers, que também inspirou alguns músicos, como o próprio Renato Russo, que na canção "monte castelo" citou trechos da primeira epístola de Paulo aos Coríntios, e a banda americana The White Stripes que batizou um de seus álbuns com o nome de "get behind me, satan", ou "pra trás de mim satanás" , frase esta retirada dos evangelhos, usada por Jesus para repreender Pedro; e a canção "40" de um dos primeiros álbuns do U2 era literalmente o salmo de número 40 das sagradas escrituras.
Então, o bom mesmo é fazer como na letra do Djavan, que eu citei na introdução do texto: arranjar um bom lugar pra ler um livro... mas com um rádio por perto, pra ouvir aquele som ao mesmo tempo. Não faz mal nenhum! É só Ter cuidado pra não misturar os personagens.

sábado, 23 de junho de 2007

Shy Moon


Lua
“O luar...do luar não há mais nada a dizer/a não ser que a gente precisa ver o luar”. Assim diz a canção de Gilberto Gil, e já que não há mais nada a dizer do luar, citarei apenas o que já foi dito desde que Elvis Presley cantou “blue moon of kentucky” e a lua se tornou tema constante no rock and roll, afinal, os brutos também amam e o luar é fonte de inspiração para os corações românticos. Os Beatles, por exemplo, cantaram “Mr. Moonlight” e o mexicano Carlos Santana cantou o luar tropical em “havana moon”.
O The Police também andou em solo lunar com “walking on the moon” e outras bandas cantaram a lua de um modo não tão romântico como o Credence em “bad moon Rising” e o Echo and the Bunymen que cantou “the killing moon”.
A lua tem seu lado sinistro, com seus lobisomens em noites de lua cheia. Rita Lee até pediu: “venha me beijar, meu doce vampiro/na luz do luar” e Renato Russo injetou mais poesia no luar na canção “sereníssima”: “minha laranjeira verde/por que estás tão prateada?/foi da lua dessa noite/do sereno da madrugada”.
Mas, os mais belos momentos lunares são dos Paralamas. Um de seus melhores álbuns se chama “Nove Luas” e é dele o belíssimo reggae “la bella luna”: “oh! Lua de cosmo/no céu estampada/permita que eu possa adormecer...” mas o melhor mesmo está na canção “tendo a lua” do álbum “Os grãos” que tem versos dignos de um Olavo Bilac: “o céu de Ícaro tem mais poesia que o de Galileu...” e “e tendo a lua/aquela gravidade onde o homem flutua/merecia a visita, não de militares/mas de bailarinos/ e de você e eu...”.
Lua dos românticos, lua dos loucos... esta última foi celebrada pelo Pink Floyd em um dos mais famosos álbuns da história do rock: “The Dark Side of the Moon”. Nele a banda presta homenagem ao seu ex-lider Syd Barret que pirou literalmente e vivia no mundo da lua. Nas entrevistas nos programas de TV ele não respondia nada, se limitava a ficar parado com os olhos fixos no vazio, e nos shows, ficava tocando o mesmo acorde o tempo todo, prejudicando a performance da banda. Na canção título do álbum, Roger Waters se refere a ele da seguinte maneira: “o lunático está sobre a grama/relembrando os dias ensolarados/as brincadeiras e os risos deixados/para manter os doidos no rumo”.
E já que não há mais nada a dizer do luar, resta a nós romântico-lunáticos (sim, todo romântico é meio louco e vice-versa) admirarmos o nosso satélite natural. Você, a música, a poesia, a lua, a rua e eu...
Te vejo no lado escuro da lua.

sexta-feira, 15 de junho de 2007

A Idéia


"solos de guitarra não vão me conquistar"
Paula Toller em "como eu quero"



A idéia
O que é a idéia? Idéia é aquele estalo, aquele momento em que o gênio é atingido por um raio dos deuses, e então, iluminado ele dá a luz à um projeto ou uma obra. E luz é o termo certo. Não é à toa que nos gibis e desenhos animados a idéia é representada por uma lâmpada acesa. Representatividade maior não poderia haver já que o inventor da lâmpada elétrica é o homem das mil patentes, o grande inventor Thomas Edison. Mas eis que no Museu Nacional da História Americana, ao lado da lâmpada de Edison e do telefone de Graham Bell, um outro invento toma seu lugar de destaque: Tchã... tchã... tchã... tchã... a guitarra elétrica.
Coube a Leo Fender, um obscuro consertador de rádios, no ano de 1948, dar á luz àquilo que seria a matéria prima do rock and roll. O fetiche já estava pronto. E durante toda a história do rock, a guitarra foi como que reinventada diversas vezes por seus ases mais criativos, como o guitarrista de blues Elmore James, que inventou a técnica da “slide guitar” , na qual o guitarrista toca deslizando um dedal de metal sobre as cordas do instrumento, ou Jimmy Page, do Led Zeppelin, que inovou ao tocar sua guitarra com um arco de violino; teve também o Eddie Van Halen que tocava usando uma furadeira elétrica!!!!
Mas aquele que é apontado por nove entre dez especialistas como o maior guitarrista de todos os tempos, Jimmy Hendrix, tanto reinventou a guitarra, tocando com os dentes, imitando ruídos de aviões e de bombas explodindo, como também destruiu (literalmente) várias vezes o invento de Leo Fender ao final de seus shows, muitas das vezes ateando fogo ao seu instrumento como que num ritual, sacrificando sua guitarra numa oferenda aos deuses das idéias.
E para finalizar, eu deixo para você um soneto de Augusto dos Anjos, a quem o poeta Geraldinho Carneiro se referiu como “o poeta heavy metal”. O título do soneto é “a idéia” como não poderia deixar de ser, e é mais ou menos o que acontece comigo.

A idéia
De onde ela vem?! De que matéria bruta
Vem essa luz que sobre as nebulosas
Cai de incógnitas criptas misteriosas
Como as estalactites de uma gruta?!

Vem da psicogenética e alta luta
Do feixe de moléculas nervosas,
Que, em desintegrações maravilhosas,
Delibera, e depois, quer e executa!

Vem do encéfalo absconso que a constringe,
Chega em seguida às cordas da laringe,
Tísica, tênue, mínima, raquítica...

Quebra a força centrípeta que a amarra
Mas, de repente, e quase morta, esbarra
No molambo da língua paralítica!



Genial! Não?

quarta-feira, 13 de junho de 2007

A Espera


"eu tô na lanterna dos afogados/eu tô te esperando/vê se não vai demorar!"
Paralamas do Sucesso, em "lanterna dos afogados"

A espera

Há algum tempo atrás, a MTV brasileira fez uma enquete com a pergunta: "qual música você colocaria como música de espera em seu telefone?" as respostas foram das mais variadas, como era de se esperar (sem trocadilho). a tendência das pessoas é colocar a "música da hora" ou então sua música favorita. Mas o ideal seria colocar uma música que falasse justamente de "espera" como o trecho dos Paralamas que eu citei aí na introdução. Uma outra boa opção seria uma música da extinta banda mineira Virna Lisi , que dizia assim: "vou esperar só mais uma hora depois desse minuto/vou esperar só mais duas horas depois desse minuto de silêncio...". mas a que eu colocaria, seria uma de outra banda extinta, a Little Quail and the Mad Birds que dizia assim: "espera um pouco/ só me espera mais um pouco/ só espera eu me arrumar/ escovar os dentes e cagar..." não é ótima?
Não existe música mais perfeita para tal.
O certo é que não existe nada mais desagradável do que esperar. Seja ao telefone, seja no ponto de ônibus, na fila do banco ou no consultório médico. E até mesmo a espera por coisas boas e agradáveis, às vezes nos causam tanta ansiedade que acaba nos incomodando. É como disse o sábio: “o tempo é demasiado lento para os que esperam; veloz para os que temem; prolongado para os que sofrem; curto para os que se divertem; mas, para os que amam, o tempo não conta.”
A espera por um amor, ou pela volta da pessoa amada já rendeu algumas boas canções como a belíssima "wait in vain" de Bob Marley (eu não quero esperar em vão pelo seu amor), ou "sentado à beira do caminho" de Roberto e Erasmo: "eu não posso mais ficar aqui/a esperar/ que um dia você volte/volte para mim". A banda Plebe Rude, na década de oitenta fez muito sucesso com a canção de protesto "até quando esperar?", e os Tribalistas cantaram: "passe em casa/ tô te esperando, tô te esperando...".
Na lendária canção "pra não dizer que não falei de flores" Geraldo Vandré cantou: "vem,
vamos embora/que esperar não é saber/quem sabe faz a hora/não espera acontecer" mas isso é meio relativo... se você estiver na fila do banco, ou do INSS, e tentar "fazer a hora" e não "esperar acontecer", o mínimo que você vai conseguir é um olho roxo.
É claro que você não vai ficar sentado em casa esperando que tudo lhe caia dos céus, mas tem certas situações em que não adianta mesmo apressar as coisas, e então só nos resta mesmo Ter muita paciência para esperar.
E por fim, tem a espera derradeira, que é a espera pela hora da nossa morte(amém), mas essa ninguém liga de ficar esperando (se bem que tem alguns apressadinhos que vão ao encontro dela). Enfim, enquanto essa dona sinistra não chega, é melhor a gente cantar como o Raul Seixas: "eu que não me sento/no trono de um apartamento/com a boca escancarada, cheia de dentes/ esperando a morte chegar...".

segunda-feira, 11 de junho de 2007


Bezerra da silva
"fui morar na favela porque não tinha onde morar, e não podia morar andando"


Casa

Ah! O sonho da casa própria! Trabalhar, e pagar durante anos aquela prestação do BNH ou da Caixa Econômica, tudo para Ter o prazer de um dia poder pendurar aquela plaquinha com as famosas palavras: "lar, doce lar", afinal de contas, o lar de um homem é o seu castelo.
Elis Regina só queria "uma casa no campo" onde ela pudesse plantar (plantar?) seus amigos, seus livros, seus discos e nada mais. Quanto ao Milton Nascimento, esse parece que morava de aluguel, pois foi ele quem cantou " minha casa não é minha, e nem é meu esse lugar" num trecho de "travessia".
Houve um cantor obscuro chamado Gilson, que no meio da década de oitenta fez muito sucesso com uma música que dizia assim: "eu queria Ter na vida, simplesmente/um lugar de mato verde/pra plantar e pra colher;/Ter uma casinha branca, de varanda,/um quintal e uma janela/ só pra ver o sol nascer". A música era uma versão de um cantor estrangeiro ainda mais obscuro que o nosso Gilson, e que quase ninguém (inclusive eu) sabe seu nome. O Gilson sumiu, e nunca mais se ouviu falar dele, mas ninguém esquece a melodia e os versos que eu citei aí em cima, e muita gente sonhou com a tal casinha, num recanto bucólico.
A realidade é que não é fácil comprar, ou construir a casa dos sonhos, e depois de tudo, ainda se tem que comprar a mobília. Na música "o mundo anda tão complicado" Renato Russo descreve um casal às voltas com esse fato: "temos que consertar o despertador,/e separar todas as ferramentas,/porque a mudança grande chegou,/com o fogão e a geladeira e a televisão./não precisamos dormir no chão(até que é bom!)/mas a cama chegou na Terça,/e na Quinta chegou o som.".
E mais adiante, ele canta: "agora que temos nossa casa,/é a chave que eu sempre esqueço.". pois é, o duro é Ter que ficar trancado do lado de fora, depois de tanta luta pra se conseguir um teto. E por falar em teto, nunca é demais lembrar do movimento dos sem-teto, aquele pessoal que, pelo descaso dos governantes, não têm onde morar, e de vez em quando invadem condomínios vazios, causando muita confusão com os proprietários. E dá tristeza ao caminharmos pelos arredores da cidade, e vermos famílias inteiras morando debaixo dos viadutos. Mas, além destes, tem também os "flagelados da paixão" , os "retirantes do amor", e os "desempregados do coração", como cantou o Lulu Santos. Se você não está incluído entre estes últimos, então "jogue suas mãos para os céus,/e agradeça se acaso tiver/alguém que você gostaria que/ estivesse sempre com você,/ na rua, na chuva, na fazenda/ ou numa casinha de sapê.".
Sendo assim, "luz acesa, me espera no portão/ pra você ver que eu tô voltando pra casa".