Wellcome

sábado, 25 de agosto de 2007

Automóveis (atropelamento e fuga)



“Vital andava à pé e achava que assim estava mal”, daí apareceram os Beatles e disseram: “baby, you can drive my car” . Thank you, mas não gosto de mão inglesa. Parece que a gente está sempre na contramão e pra parar na contramão já basta o Roberto Carlos. além do mais, o volante fica do lado direito e você fica o tempo todo procurando a alavanca de marchas do lado da porta. Prefiro buzinar meu calhambeque BIP!BIP!, aliás, “meu carro é vermelho e não uso espelho pra me pentear”; ele “não tem breque, não tem luz, não tem buzina/tem três carburadores, todos três envenenados/só para na subida quando falta gasolina/só passa se tiver sinal fechado”. O Capital inicial cantou: “Tenho pedras nos sapatos/onde os carros estão estacionados” e “as ruas tem cheiro de gasolina e óleo diesel” . “mas Vital comprou a moto e passou a se sentir total” ao que o Renato Russo respondeu: “motocicletas querendo atenção às três da manhã é só música urbana” . Tá certo que a polícia não entende e aí ele é obrigado a dizer: “qualé seu guarda/que papo careta/só tô tirando chinfra/com a minha lambreta.”
A Rita Lee pedia: “papai me empresta o carro/pra eu poder tirar um sarro com meu bem”... não sei se o pai dela era legal, mas o do Roger Moreira do Ultraje a Rigor era, pois foi ele que cantou: “e o meu carro foi meu pai quem me deu/filho homem tem que Ter um carro seu”.
pois é, a imagem do rock and roll sempre foi ligada à carangos e motocas, desde os Thunderbirds e lambretas dos anos 60 até chegar na impagável aventura dos Raimundos à bordo do Opalão na música “eu quero é ver o oco” e por falar em Opala, um Opala azul foi co-protagonista da canção suicida “dezesseis” da Legião Urbana, aquela em que Jonny bate de propósito com um caminhão por causa de um coração partido. E por falar em canção suicida, a música “there’s a light that never goes out” do The Smiths talvez seja a canção suicida mais bonita de todos os tempos. Nela, Morrissey canta os seguintes versos:
“...dirigindo no seu carro,
eu não quero mais voltar pra casa
porque eu não tenho mais casa.
e se um ônibus de dois andares
bater de frente com a gente,
morrer ao seu lado
seria morrer de um jeito celestial.
e se um caminhão de dez toneladas
matar a nós dois,
morrer ao seu lado,
o prazer e o privilégio seriam meus.”
E aí? Quer pegar uma carona com o Morrissey ou você prefere ir de táxi com a Angélica? Ou quem sabe no fuscão preto?
Os Mamonas Assassinas pelo menos tinham uma Brasília amarela e quando a Monica foi se encontrar com o Eduardo, ela foi de moto e o Eduardo de “camelo”. O Chorão do Charles Brown Jr. Também cantou: “ela tem carro importado e telefone celular/eu só tenho uma “magrela” e um AP no BNH”. Mas, quanto a mim nem isso. Eu tô mais pra aquela canção da Legião:
“andar à pé na chuva
ás vezes eu me amarro
não tenho gasolina
também não tenho carro
também não tenho nada
interessante pra fazer...
tédio com um T bem grande pra você!”




Vruuuummmmmmmmmm! Fui.

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

O Reino de Morfeu


"O sono é bom.
Pois que acordamos dele
Para saber que é bom.
Se a morte for um sono,
Acordaremos dela.
Se não, não é sono."
Fernando Pessoa
O Sono
Na música "enter sandman" (entra o mestre dos sonhos), um rock pesado, com letra falando sobre pesadelos, monstros dentro do armário, debaixo da cama e etc., a banda Metállica encaixou aquela famosa oração que os pais ensinam as crianças recitarem antes de dormir: "agora me deito para dormir/ peço ao senhor pra minha alma guardar/ se eu morrer antes de acordar/ peço ao senhor pra minha alma levar". Esse sim, foi o verdadeiro "rock and roll lullaby", e não aquela baba que o B.J. Thomas cantava com esse mesmo título, e que foi sucesso na década de 70. "lullaby", é como se chamam as canções de ninar em inglês, e a banda The Cure também fez uma bela canção com esse nome.
Com canção de ninar ou não, todos concordam que tirar aquela soneca é realmente muito bom. Aquela famosa "sesta" depois do almoço, quando bate aquela "lombeira" então nem se fala! Mas o bom mesmo é dormir sem aquele chato do despertador por perto. Sem essa de acordar cedo! O negócio é fazer como o Renato Russo na canção "o mundo anda tão complicado" a qual tem um verso que diz: "hoje eu acordo ao meio dia/ amanhã é a sua vez". Renato Russo, aliás, parece que gostava de velar o sono da pessoa amada, pois nessa mesma canção, logo no início ele diz: "gosto de ver você dormir/ que nem criança com a boca aberta", e em outra canção chamada “antes das seis” ele canta assim: "daqui vejo seu descanso/ perto do seu travesseiro/ depois quero ver se acerto/ dos dois quem acorda primeiro". A Paula Toller também tinha essa mania, pois ela canta "ver você dormir/ me corta o coração" no início da impagável canção "deixa eu ser seu espião". Mas, a música na verdade era sobre ciúme, e a personagem doentia, tinha ciúmes até dos sonhos da pessoa amada.
Na canção MLK, do U2, Bono Vox canta assim: "durma... durma esta noite/ e que seus sonhos se realizem...". Ali, ele estava falando do sono eterno, o sono da morte, pois a canção era uma homenagem a Martin Luther King,
que morreu no ano de 1968, no meio de sua luta pelos direitos civis, em que ficou marcado seu famoso discurso "I have a dream" (eu tenho um sonho). Mas, como disse o poema do Fernando Pessoa que foi citado na introdução do texto, se a morte for um sono, acordaremos dela. Enquanto isso nada melhor do que tirar uma soneca daquelas. Só não pode é dormir no ponto como fez o baterista Pete Best, que faltou aos ensaios dos Beatles e acabou perdendo o posto para o Ringo Star, deixando assim, de fazer parte da maior banda de Rock de todos os tempos... é Pete Best, durma-se com um barulho desses! Aliás, Lennon e McCarteney escreveram um belo hino ao sono, a canção "I'm only sleeping", que tem versos como: "por favor não me acorde/não me balance/deixe-me onde estou/eu só estou dormindo..." e "parece que todo mundo me acha preguiçoso/eu não ligo, eles são loucos..." e no final, "por favor, não me estrague o dia/eu estou a milhas distante/e, afinal de contas/eu estou apenas dormindo." Lennon já dormiu o sono eterno, e se a morte for apenas um sono, ele vai acordar. McCarteney continua vivo, e é dono de uma das maiores fortunas da Inglaterra. Segundo o livro de provérbios, na Bíblia Sagrada, "doce é o sono do trabalhador, quer ele coma pouco ou muito; mas a fartura do rico não o deixa dormir". Paul, a essas alturas, não está conseguindo dormir em paz...

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Aquarela Sombria



Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo...
Amarelo pálido, desbotado, de uma estrela moribunda que esfria;
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo em ruínas,
Desmoronando, e habitado por ratos e lagartos;
Com um lápis em torno da mão eu me dou uma luva de boxe,
Para lutar contra meus monstros e medos;
E se faço chover, chove uma chuva ácida, de uma atmosfera impregnada de agentes químicos,
E com dois riscos tenho um guarda-chuvas perfurado, dilacerado pelos ácidos corrosivos.
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel,
Num instante imagino um abutre esfomeado
Voando sobre os cadáveres que apodrecem na terra deserta e devastada...
Vai voando, contornando as colunas de fumaça negra das florestas carbonizadas que fumegam,
E eu vou voando com esse abutre... viajando: Somália, Haiti, Etiópia, Serra Leoa...
Pinto um barco à vela que vai navegando mares poluídos até ser atingido por um beijo de um torpedo militar.
E entre as nuvens vem surgindo uma esquadrilha de caças, bombardeando a aldeia miserável,
E o bombardeio, à noite, parece uma queima de fogos de artifício mortal.
Basta imaginar, e a esquadrilha está sendo dizimada pela bateria antiaérea, e aquele soldado que ejetou antes do impacto não vai mais voltar...

Numa folha qualquer eu desenho um navio indo a pique, atingido por um submarino nuclear...
Não sobrou nenhum amigo, e eu bebo na taça amarga da solidão.
De uma América a outra o ódio e a intolerância se espalham em um segundo.
Giro um simples compasso, e num círculo eu faço um mundo apocalíptico.
Um menino caminha, e caminhando chega no paredão, de olhos vendados, diante do pelotão de fuzilamento.
E ali logo em frente, a esperar pela gente, está o futuro sombrio...
E o futuro é um poço escuro e sem fundo. não tem tempo nem piedade, mas tem licença pra matar...
Pode ser doença, atentado, bala perdida, e só nos resta chorar.
Nesta estrada esburacada, cheia de crateras de bombas, com os olhos ardendo, não dá pra enxergar o que virá.
Vamos todos juntos, como condenados, caminhando para o matadouro, numa passarela de horror, de uma aquarela que um dia enfim... chegará ao fim.

sábado, 4 de agosto de 2007

O Cineasta e a Morte





Quando ela chegou, o velho cineasta já estava a sua espera. Ela veio sombria como só ela sabe ser, e ele a reconheceu logo, afinal, ele já havia retratado-a em “O Sétimo selo”. E já sabia de suas intenções, já que na vida real ela nunca vem só pra conversar. Mesmo assim ele a convidou para uma partida de xadrez.
- Xadrez não, porque demora muito e eu tenho muito trabalho a fazer, mas aceito uma partida de damas – respondeu ela.
- Até que eu não a retratei mal - disse o cineasta - Se naquela época houvesse os recursos digitais que existem hoje eu teria feito melhor. Eu poderia colocar o mesmo vazio no lugar dos seus olhos, e deixar o seu sorriso assim mais cadavérico. Eu tive que carregar na maquiagem do ator, e, às vezes o resultado era mais cômico do que trágico.
- Você se saiu bem - respondeu ela – o resultado final foi impressionante. Efeitos especiais apenas divertem os olhos. O importante é que o filme tem alma, e você sabe que de alma eu entendo...
- Como está o velho Alfred lá do outro lado?
- Você está se referindo à Hitchcock?
- Ele mesmo...
- Ele adaptou-se bem. Ele sempre lidou bem com temas mórbidos aqui, então já estava meio que preparado.
- E quanto a Fellini?
- Esse não achou a morte tão “dolce” assim... aliás, devo lhe dizer que mais tarde venho buscar outro colega seu, que por sinal, também é italiano.
- Será o Roberto Benigni?
- Não. Ele ainda tem algum tempo para desfrutar da vida, a qual ele disse ser bela. Veremos o que ele vai achar de mim...
- Quem será então?
- Não apresse as coisas. daqui a pouco vocês vão se encontrar de qualquer forma...
Na tentativa de ganhar algum tempo, Bergman, o velho cineasta, esforçou-se bastante no jogo de damas e conseguiu um empate. Assim, a conversa rolou um pouco mais. Mas veio o desempate e a Morte venceu (na vida real, ao contrário do filme, ela sempre vence no final). Então, ela levantou-se e se pôs do lado direito do cineasta e ofereceu-lhe o braço. Os dois então, caminharam lentamente até a barca vil e sinistra que os esperava.
No mesmo dia,um pouco mais tarde, em Roma, a mesma barca estacionou em frente a casa de Antonioni. Só ele viu, mais ninguém, quando aquela figura de capa preta, olhar vazio e foice na mão, caminhou em sua direção e parou em sua frente. Ele levantou-se foi ao encontro dela e disse:
- você não me é estranha...


FIM